“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, o tempo passa e São Teotónio transforma-se e adapta-se. Quem se lembra de antigas casas de comércio, que ainda há poucas décadas existiam?
O Casanova; as Donas Gasparinhas; as Meninas Manuelas; a D. Vitória d’alagoa; A mercearia e a sapataria Efigénio; a mercearia da menina Tomásia; o talho Rosa Ferreira ou a loja da D. Chica Barreiras? A casa de rendas da D. Bia Rodrigues ou as retrosarias da D. Jandira ou da D. Bia Nobre?
E a oliva ou a espingardaria do Sr. António Miguel que também era proprietário da oficina de consertos de bicicletas hoje explorada pelo Zé Carlos? Aí perto na rua de Odemira, havia também a Singer do Sr. Manuel João Martins cuja placa ainda se encontra afixada na parede. E mais acima já na rua Alexandre Herculano havia a mercearia da D. Maria Viana Bento e do Sr. Bento um pouco mais moderna.
Alguém recorda o barulho das máquinas na moagem, o cheiro a farinha e o pó branco que invadia a rua Alexandre Herculano? E as praças do peixe ali perto, a do Sr. José Maria Canelas na rua dos Carrasqueiros e a outra no Largo mais tarde explorada pelo Sr. Elvino?
Quem se lembra da abertura do restaurante no encalhe que pertenceu à D. Virgínia, tia da famosa actriz Delfina Cruz, onde as pessoas do campo ouviram rádio pela primeira vez?
Em São Teotónio havia diversas tabernas, como a do Tonicha, a do Sr. Serralheiro, a dos Paulinos ou do Sr. Baiona que deu lugar ao actual estabelecimento do Sr. Manuel Augusto. Existiu também uma taberna um pouco acima da antiga farmácia Lança, que pertenceu à Sr.ª Maria Viana e que explorava também uma loja de fazendas e venda de farinhas.
Mais tarde nesse local o Sr. Augusto da Casa do Povo abriu outra taberna vulgarmente chamada de tendinha. Lembramos ainda o Sr. Barreiros, que começou a trabalhar na taberna da Sr.ª Maria Viana e que posteriormente se estabeleceu um pouco abaixo por conta própria explorando uma taberna e uma mercearia.
Com o evoluir dos tempos as tabernas passam a ser menos procuradas, dando lugar aos cafés que se inauguram para uma clientela mais vasta e elitista. O Café Bolinhas é ainda hoje o testemunho desses tempos, foi inaugurado com o nome de Café Paraíso sendo o seu primeiro proprietário o Sr. José Maria Bilha.
Muitos desses estabelecimentos foram locais de reunião e de conversa, com clientela assídua, quase uma família, os balcões com vitrinas e balanças, os escaparates nas paredes repletos de mercadoria, o papel pardo e os atilhos para embrulho, os preços marcados a lápis em cartões, o cheiro característico que distinguia cada espaço e cada tipo de negócio, a mistura e disposição de artigos que contrariava qualquer norma da ASAE.
Neste verão a loja do Sr. António Augusto teve de mudar de sítio porque o prédio de gaveto será derrubado. A “casa do totoloto” encontra-se agora na mesma rua contudo noutro edifício. A mudança de local é apenas o prenúncio do fim de um negócio que foi iniciado pelo Sr. João Pedro da Costa.
Restam ainda algumas casas que se transformaram ao longo dos tempos como a loja do Sr. Chobita, mas a única que resiste incólume ao passar dos tempos é a velhinha loja dos Gaspares.
Embora o comércio de São Teotónio não tenha muito fulgor, surgem agora novos conceitos trazidos dos grandes centros urbanos como a Alisuper ou o Intermarché. A modernidade espreita a cada canto e hoje São Teotónio já não é a velha aldeia. Porém seria desejável que pensássemos e olhássemos para alguns autênticos “case studies” de outras regiões do país, onde aldeias em declínio demográfico foram adquiridas por investidores que as transformaram em aldeias turísticas, lugares ímpares e com potencial para atrair visitantes de todo o mundo.
Ora não sendo São Teotónio um grande centro urbano e existindo uma forte atractividade turística nesta região, devem os governantes continuar a permitir que se extinga este antigo património que caracteriza e identifica esta vila? Não seria agora a altura de finalmente começarmos a salvaguardar a nossa identidade, aquilo que nos demarca dos demais?
Hoje a vila seria mais rica se o arco da casa da praça na rua dos Carrasqueiros ainda existisse, se a sineta que chamava as pessoas para comprar o peixe ainda pudesse tocar, se a rua da fonte se mantivesse, se o poço da rua do castelo conservasse a compleição original, se as ruas antigas ainda fossem empedradas. Não é por acaso que os turistas visitam recorrentemente os centros históricos dos nossos povoados.
Quanto ao novo comércio, não poderá haver algum apoio e incentivo que permita aos comerciantes conservarem e restaurarem as antigas lojas, com o antigo mobiliário adaptado aos nossos dias, como aconteceu em tantos centros históricos deste país onde através do Programa Procom foram salvaguardadas e restauradas lojas seculares?
Entendamos que a modernidade pode e deve cruzar-se com a antiguidade!